terça-feira, 29 de junho de 2010

Continuando : "Rochedos e Colinas"


VIII

Ezequiel e Sebastião já cavalgavam há horas quando ele percebeu que seu cavalo já não possuía a mesma velocidade do início, sinal de que ele precisava de alguns minutos para beber água e descansar. Mesmo odiando o fato de ter que parar e assim atrasar ainda mais o momento de ter Clarissa em seus braços, ele parou. Ao ver o gesto do líder, Sebastião fez o mesmo. Havia uma cachoeira por perto e foi para lá que os dois conduziram os animais. A água cristalina era um convite para molhar seus corpos castigados pelo sol forte, mas Ezequiel ignorou essa necessidade de seu corpo. Sebastião, porém se abaixou e com a mão em forma de concha pegou o máximo de água que pôde para levar a boca. De repente, um barulho de galho seco quebrando se fez ouvir. O barulho tinha vindo detrás de um mato alto e Ezequiel se pôs imediatamente em alerta, assim como Sebastião e os dois cavalos. Fazendo um sinal para que o amigo não se mexesse, Ezequiel tirou a espada da bainha e caminhou devagar em direção ao som, mas antes que pudesse chegar até o espesso mato alto, ele sentiu algo enrolar nos seus pés e, de uma hora para outra, ele se viu de cabeça para baixo. Sebastião ainda tentou desembainhar sua própria espada, mas sentiu que alguém pulava sobre ele, derrubando-o ao chão. Mesmo de ponta a cabeça, Ezequiel viu que cerca de três homens se aproximavam dos cavalos como se procurassem algo.
Furioso, ele gritou:
__Me soltem!
Os homens se entreolharam e o que parecia mais velho do grupo perguntou:
__Onde está o ouro?
__Não temos ouro nenhum! – respondeu Ezequiel agradecendo o fato de não estar com o anel que daria para Clarissa. “Antes perdido na floresta do que nas mãos de ladrões de estrada.” – pensou.
Os homens pareciam não saber o que fazer e Ezequiel disse:
__Se nos soltar, eu prometo que trarei ouro para você.
O que provavelmente era o mais novo do grupo falou:
__Não acredite nele, meu pai. Se os soltarmos eles voltarão com mais homens do clã das Colinas para nos matar.
__Não! Nós não fazemos parte do clã das Colinas, nós somos do clã dos...
__Cale-se! – gritou o mais velho caminhando na direção dele. Ezequiel sentiu sua raiva aumentar e olhou para baixo a procura de sua espada apesar de saber que estava longe demais para conseguir alcança-la.
O homem se aproximou mais dele e falou:
__Meu filho tem razão. Não posso deixar vocês vivos.
Ezequiel o viu erguer uma faca e decidiu encarar a morte de frente.

domingo, 27 de junho de 2010

Uma pausa...

Tô dando uma pausa na história para falar sobre o filme Toy Story 3 que vi hoje. Não leia se não gosta de spoilers, ok?:

A história dos brinquedos é muito tocante! Não é apenas para fazer rir. É para fazer refletir! Impossível não nos compararmos com os brinquedos.
Assim como eles nós temos muito medo de sermos esquecidos,abandonados, jogados no lixo. Principalmente se isso for feito por alguém que amamos muito. Os brinquedos amam seu dono e não conseguem e nem querem entender que ele não é mais uma criança e que realmente chegou o momento de dizer adeus.
Existiam milhões de modos de fazer isso com os brinquedos e, no final, Andy escolheu o melhor deles. Nada de jogar no lixo, em um sótão ou dar para crianças que iriam apenas destruí-los. Ele os deu para uma criança que iria cuidar bem além de brincar muito.
Um belo gesto!Que sirva de exemplo para quem vai se separar de alguém. Que esse último cuidado seja o último gesto de amor por todo tempo passado juntos.
O desenho nos mostra também que não devemos nos tornar prisioneiros do passado mesmo que tenha sido um passado maravilhoso. Temos que manter nosso foco sempre no presente e guardar os bons momentos e as pessoas que estiveram nele no coração porque dali ninguém pode nos tirar.
Essa é a lição que os brinquedos nos passam. Eles conseguem entender que irão ter novos momentos maravilhosos que serão proporcionados por outras pessoas e outros lugares sem que isso tire o passado deles.

Eu sinto saudade do tempo que meus irmãos eram solteiros e morávamos todos juntos aqui em casa, mas se eles não tivessem crescido e ido embora não teriam tido seus filhos. Eu não teria meus sobrinhos que são o meu tesouro maior! Então, eu tenho que agradecer por essas mudanças e deixar o passado onde deve ficar. No coração e não no presente.

Alana não acendeu nenhuma vela perto de Ezequiel, mas mesmo assim ele fez suas preces. Primeiro para pedir ao Senhor que recebesse todos os seus amigos, homens de bem que tinham sido mortos. Depois para agradecer por sua mãe e as crianças estarem bem e por poder contar com Sebastião ao seu lado na batalha que iria enfrentar. Por último, ele pediu para que Ele continuasse protegendo Clarissa de Magnus Sores.


VII

Quando os primeiros raios de sol apareceram encontraram Ezequiel recusando a mão que Sebastião lhe estendia e se levantando sozinho da cama, tentando demonstrar total controle sobre seu corpo embora ainda sentisse uma leve tontura.
__Já estão prontos? – perguntou Igor se aproximando deles.
__Sim, estamos. E você, quando pretende buscar minha mãe e as crianças?
__Assim que Alana acordar.
__Irá levá-la com você?
__Sim, eu só possuo um cavalo e por isso, só poderei trazer a sua mãe na garupa. As crianças terão que vir andando. Sendo assim achei que seria bom levar Alana para cuidar melhor delas pelo caminho.
__Ótimo! É melhor não deixa-la sozinha mesmo ou ela poderá querer nos seguir.
Sabendo que a irmã seria bem capaz disso, Igor nada disse. O cavalo que aguardava Ezequiel relinchou, como se o chamasse.
__Chegou à hora. – disse Ezequiel mais para si do que para os outros enquanto ia de encontro ao seu cavalo que Sebastião tinha trazido.
Ao ver o animal, ele lembrou do momento em que tentou alcançar Clarissa e só não conseguiu porque desmaiou.
“Mas eu logo a alcançarei. Nada irá me parar dessa vez”. Foi com esse pensamento que Ezequiel montou no cavalo. Sebastião também montou no seu e não demorou muito para os dois saírem galopando. Igor ficou os olhando até que sumissem de vista e foi para dentro de casa. Iria acordar Alana para que pudessem ir buscar a mãe de Ezequiel e as crianças, mas assim que abriu a porta do quarto, ele foi invadido pelo desespero.
A cama de Alana estava vazia.

segunda-feira, 21 de junho de 2010


Não querendo falar sobre o passado do qual também era vítima, Igor olhou para Ezequiel e disse:
__Sua mãe e mais oito crianças ficaram sob os cuidados de um menino de dez anos. Ele fica segurando uma espada que é quase maior que ele. Eu tenho certeza de que ele dará a própria vida para protegê-las, mas peço sua permissão para abrigá-los aqui até sua volta.
Ezequiel pensou por um momento e perguntou:
__Você tem uma espada?
__Sim, quer dizer, não. Na verdade, a única espada que tem nesse aposento é sua.
__Minha?
__Isso mesmo. Ela estava caída ao seu lado quando Alana e eu o encontramos. Por isso, nós a trouxemos, mas em nenhum momento pensamos em ficar com ela. Iríamos lhe entregar assim que estivesse recuperado e pronto para partir.
Ezequiel passou a mão pela barba. Seus olhos já não tinham mais nenhum foco. Ele tentava lembrar do momento que tinha pegado à espada, mas não conseguia. Então, desistiu e perguntou a Sebastião:
__Trouxe quantas espadas?
__Quatro. Uma já era minha e as outras três eu peguei de três dos nossos falecidos homens.
__E a minha espada? Eu lembro que não estava com minha espada na festa. Não queria algo que lembrasse guerra no momento de meu casamento com Clarissa.
__Entendo, senhor. E eu realmente procurei por mais espadas na nossa aldeia, mas, como já disse antes, não havia nada além de cinzas e sangue.
__Parece que o clã de Magnus Sores levou mais do que nossas mulheres. – disse Ezequiel batendo com força, o punho fechado na parede.
__Foi exatamente o que ele fez com o nosso povo. –disse Alana e dessa vez havia em sua voz um misto de ódio e tristeza.
Para fugir mais uma vez do assunto, Igor perguntou a Ezequiel:
__E então? Posso trazer sua mãe e as crianças para ficarem aqui?
__Sim, desde que fique com a espada que encontrou caída ao meu lado e a use se for necessário.
Igor sentiu os olhos da irmã sobre ele e com medo de que ela revelasse para Ezequiel e Sebastião que ele não sabia nem ao menos segurar uma espada, ele se apressou em dizer:
__Farei o meu melhor.
Ezequiel desejava ter outro homem a quem pudesse confiar sua mãe e as crianças, mas não tinha outra escolha. Só esperava que Igor não fugisse a luta como já tinha feito antes.
__Creio que será inútil pedir para que me leve com você amanhã - disse Alana e havia algo de selvagem em sua voz que surpreendeu Ezequiel já que nenhuma mulher tinha se dirigido a ele daquele modo antes.
__Não comece com essa história de novo, Alana. Aliás, é melhor você ir para o seu quarto e...
__Eu estou falando com o Ezequiel e não com você, Igor.
Igor empalideceu e abriu a boca, mas antes que dissesse algo, Ezequiel falou:
__É inútil mesmo, Alana. Eu jamais levaria uma mulher para a guerra. Pensei que já tivesse deixado isso claro ontem.
Alana o olhou durante um momento. Um instante em que ele julgou que ela fosse agredi-lo, mas surpreendendo-o novamente, ela apenas disse:
__Se essa é a sua última palavra, eu não pedirei mais. Agora se me dão licença, eu irei para o meu quarto.
Os três ficaram em silêncio enquanto Alana se retirava. Só após ouvir o barulho da porta do quarto sendo fechada foi que Ezequiel olhou para Sebastião e disse:
__Vá dormir agora, meu amigo porque partiremos assim que os primeiros raios de sol surgirem.

sábado, 12 de junho de 2010


No resto da tarde, Ezequiel se manteve em silêncio e na maior parte do tempo, ficou de olhos fechados. Ele não conseguia e nem queria dormir, mas preferia não ficar olhando para Alana.
Ela, por sua vez, ficava pensando no que dizer para ganhar a confiança dele. Para fazê-lo mudar de idéia quanto a levá-la para enfrentar Magnus.
Quando a noite chegou, Ezequiel disse:
__Não agüento mais esperar!
Alana sabia que para um alguém como ele, esperar era algo muito difícil. Ele era um líder, um homem de ação. Assim como seu pai tinha sido. Surpresa por ter comparado um homem que mal conhecia a seu adorado pai, Alana começou a andar de um lado para o outro na tentativa de concentrar seus pensamentos em Igor.
Com os olhos, Ezequiel acompanhava os movimentos dela e após alguns segundos disse:
__Seu vai- e- vem já está me deixando tonto.
__Desculpe é que... – Alana não teve tempo de terminar a frase porque ouviu o som de cavalos se aproximando e correu para a janela.
__É seu irmão? – perguntou Ezequiel começando a levantar.
__Sim e ele não veio sozinho!

VI

Mesmo sem saber qual de seus amigos estava com Igor, Ezequiel sentiu-se mais forte e quando, finalmente viu Sebastião entrar no pequeno aposento, ele sorriu pela primeira vez desde que seu casamento tinha sido interrompido pelo clã das Colinas.
__Senhor, não sabe como me alegro em vê-lo vivo. – disse Sebastião se curvando diante de Ezequiel que no mesmo instante colocou uma mão em seu ombro dizendo:
__Também estou feliz em vê-lo, meu amigo.
Sebastião levantou os olhos parecendo surpreso em ser chamado de amigo por seu líder, mas ignorando isso, Ezequiel perguntou:
__Onde estão minha mãe e os outros? Quantos mortos e feridos? Conte-me tudo.
__Sua mãe está bem, ela está segura dentro de uma gruta junto com as crianças. Graças ao bom Deus, nenhuma criança foi ferida, mas, infelizmente...
Sebastião parecia não saber como continuar, mas mesmo desconfiando que ouviria algo horrível, Ezequiel insistiu:
__ Mas infelizmente o quê, Sebastião?
__ Nós perdemos todos os nossos homens,senhor.
__Todos?! Como assim todos?!
__É tão horrível de explicar, mas assim que o ataque começou perdemos muitos homens pisoteados pelos cavalos dos inimigos. Depois mais alguns foram mortos enquanto duelavam para impedir que suas esposas fossem levadas. Por fim, os que restaram montaram em seus cavalos e seguiram os raptores, mas foram todos atingidos por flechas envenenadas. Eu só sobrevivi porque estava mais atrás e ao ver o que estava acontecendo parei de segui-los.
__E por que não tentou socorrê-los? Eu também levei uma flechada, mas sobrevivi.
__Eu tentei, senhor, juro que tentei, mas já não tinha mais nada a ser feito, eles estavam agonizando e só me pediram para que voltasse para cuidar das crianças. E foi o que fiz. Eu voltei e encontrei o que antes era nossa bela aldeia reduzida a cinzas e sangue. Eu achei que iria ficar louco e provavelmente teria ficado se não fosse ter visto Tomás saindo de cima de uma das árvores. Ele tinha ficado todo o tempo escondido ali e tinha visto para onde as outras crianças tinham ido. Então, nós fomos nos reunir a elas.
Ezequiel sentiu um aperto no peito, mas nada disse. Sabia que se falasse seria com a voz trêmula e embargada pelo nó que ele tinha na garganta.
__Foi exatamente o que ele fez com o nosso povo. – disse Alana e o ódio em sua voz era tão grande quanto a dor que havia na de Sebastião.

quinta-feira, 10 de junho de 2010


Quando achou que já tinha amassado as bananas o suficiente, Amanda se aproximou de Ezequiel e perguntou:
__Consegue comer sozinho ou quer que eu lhe dê a comida na boca?
__Só o meu ombro esquerdo foi machucado, eu posso mover o braço direito normalmente. – respondeu ele pegando o prato da mão dela.
__Ótimo, então enquanto você come, eu preparo o seu chá.
__Eu não bebo chá e...
__Bebe sim, quer dizer, pelo menos bebeu várias vezes nas primeiras quatro horas em que esteve aqui e também ontem à noite quando estava delirando de febre.
Ezequiel nada disse e ela continuou:
__Não sei se o gosto deles é bom ou ruim, mas sei que você só está vivo porque consegui fazer com que os bebesse.
Ezequiel pensou em agradecê-la, mas ela olhou para o prato na mão dele e disse:
__Agora coma isso!
O tom autoritário na voz dela fez com que o sentimento de gratidão desaparecesse por completo e mais uma vez ele se viu dividido entre a irritação e a admiração.
“Eu não deveria falar assim com ele. Deveria tentar ser amiga e convencê-lo a me levar com ele para enfrentar Magnus.” – ela pensou enquanto fazia o chá e sentia os olhos dele sobre ela.
Ezequiel queria desviar os olhos, mas não conseguia parar de observá-la. Ela era muito pequena, o que o fez pensar que não deveria ter mais do que vinte anos. Mais uma razão para que o tratasse com mais respeito já que ele era mais velho.
Quando o chá ficou pronto, Ezequiel desviou os olhos de Alana para o prato e o colocou sobre o colo. Achava que não iria conseguir comer, mas seu estômago estava pedindo por isso. Então, em três garfadas cheias, ele comeu tudo.
Vendo que ele já tinha terminado, Alana lhe estendeu a caneca com o chá, ele pensou em perguntar do que era feito, mas achando melhor manter o silêncio entre eles, ele apenas pegou a caneca que ela oferecia e deu um grande gole. O líquido morno desceu gostoso pela garganta e ela perguntou:
__E então? É bom ou ruim?
Ezequiel a olhou, mas antes de responder virou toda a caneca e bebeu o restante do chá de um gole só, dizendo em seguida: __É bom.
Alana abriu um pequeno sorriso enquanto pegava a caneca vazia das mãos dele que não pôde deixar de notar o quanto isso a deixou mais bonita.

sexta-feira, 4 de junho de 2010


Sozinha em sua cama, Alana não pôde deixar de pensar se Clarissa sabia o quanto era amada pelo noivo e se era digna desse sentimento, se seria capaz de amá-lo com a mesma grandiosidade.
“Por que estou pensando nisso? Que diferença faz se ela o ama ou não? Ela foi raptada pelo homem que mais odeio no mundo e tenho certeza de que ele deve estar fazendo-a sofrer. Tudo o que posso fazer no momento é pedir a Deus que a proteja, mas em breve, eu poderei fazer muito mais que isso.”
Os olhos dela pousaram sobre um canto do quarto, atrás de onde ficavam seus vestidos velhos. Ali, ela guardava algo que tinha certeza de que ainda iria usar. Iria usar para matar Magnus Sores.
__Mas, por enquanto, tudo o que eu posso fazer é pedir a Deus para proteger a noiva de Ezequiel.- ela disse enquanto de mãos unidas e olhos fechados, começava a rezar.
Os primeiros raios de sol entraram pelo pequeno buraco da parede e a iluminaram. Sentindo-se envolvida pela luz, ela se ajoelhou. Era a primeira vez que rezava desde que seu pai tinha sido assassinado.
Alguns minutos depois, Alana voltou à sala e ao parar em frente a Ezequiel e perguntou:
__Você está com fome?
__Não.
__Mas terá que comer mesmo assim.
Ezequiel abriu a boca para falar que não iria comer nada, mas Alana lhe deu as costas e em passos rápidos se dirigiu para a porta.
__Onde você está indo? – ele perguntou e em resposta só teve o barulho da porta se fechando atrás dela.
“Essa moça não é igual às mulheres do meu clã.” Pensou Ezequiel em um misto de irritação e admiração.
Não demorou muito e Alana voltou carregando uma penca de bananas. Em silêncio, Ezequiel a viu retirar as duas bananas mais maduras, descascá-las e em seguida, coloca-las em um prato de madeira, onde com um garfo, também de madeira, começou a amassá-las. Esse era um gesto que ele já tinha visto todas as mulheres de seu clã fazerem, mas nenhuma delas o fazia com tanta força. As mulheres de seu clã eram serenas e pelo pouco que ele conhecia de Alana, sabia que serenidade era algo que ela não possuía.